Além de estabelecer um romance entre duas espécies, pode-se dizer que A Forma da Água serve de pano de fundo várias histórias simultâneas.
A partir do ponto central que é o romance entre Elisa (Sally Hawkins) e a criatura subaquática (Doug Jones), o filme traz para o público um thriller sobre a Guerra Fria e, acreditem, isso funciona muito bem aqui, empregado de maneira orgânica, sem prejudicar a narrativa principal.
A fotografia da projeção utiliza tons de verde e azul para retratar situações de perigo, medo, angústia e também usa o verde para criar esperança e restauração conforme as necessidades da narrativa.
Enquadramentos perfeitos a cada cena e uso preciso de câmeras nos fechamentos dos personagens, trazem mais realidade das emoções, especialmente da criatura que, mesmo com a maquiagem, consegue transmitir tristeza, alegria e outras reações com clareza, em um excelente trabalho de Doug Jones.
As interpretações, em sua maioria, são ótimas, com destaque para a protagonista Elisa, que apesar das limitações que poderíamos imaginar para uma personagem muda de nascença, transmite toda a compaixão, medo, solidariedade, coragem, curiosidade e insolência sem se expressas por meio da fala. Michael Shanon, aqui, um vilão com “V” maiúsculo, é implacável, sádico, arrogante e mau, o que funciona perfeitamente durante a trama. Ponto para Del Toro, que consegue desenvover um antagonista como esse sem cair no genérico.
Octavia Spencer interpreta com eficiência a melhor amiga de Sally, Zelda, porém, no decorrer do filme não é apresentando nada demais relacionado a ela. Richard Jenkins, como de costume perfeito, dá vida a um personagem carismático, que passa a impressão de ter algo faltando em sua vida, embora algumas de suas falas soem forçadas, o que pode ser natural em filmes com motivação, mas nada que comprometa a narrativa.
Talvez o personagem mais interessante seja o de Michael Stuhlbarg, dividido entre o dever e a moral, ele basicamente transita livremente entre os “dois mundos do filme”, dando um ar de esperança em alguns momentos. O já veterano em caracterizações em filmes, Doug Jones, tem uma estrutura corporal que ajuda a compor perfeitamente a criatura. Além disso, Jones tem a capacidade de acertar o tom em uma interpretação complicada, já que sua criatura também não fala e se comunica de um jeito próprio.
Um dos pontos que mais chama atenção é a mistura de temas como o contexto da Guerra Fria, preconceito, racismo, machismo e a maneira como são interligados no decorrer da trama.
A produção é também uma homenagem explícita aos filmes de monstros da década de 1950 e Del Toro não faz questão de esconder isso. O espectador que observar atentamente poderá notar essas referências durante a projeção.
Com 13 indicações ao Oscar, A Forma da Água é um ótimo filme, apesar de não ser perfeito, faz bem o dever de casa, e Del Toro consegue fazer algo competente, que começa a ser reconhecido por meio das indicações a premiações.