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Elysium [Crítica]

Alexandre Landucci 11 anos ago 0 106

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(Elysium, 2013)
Ficção Científica – 109 min.

Direção: Neill Blomkamp
Roteiro: Neill Blomkamp

com: Matt Damon, Jodie Foster, Sharlto Copley, Wagner Moura, Alice Braga

Embora vá até parecer perseguição começo o texto relembrando uma entrevista que o diretor Neill Blomkamp deu ao site Collider pouco antes do lançamento de Elysium nos Estados Unidos. Entre outras coisas, Neill disse que não via televisão há oito anos. Esse tipo de afirmação, além de me parecer arrogante (do tipo: o que se faz na TV é “arte de segunda” e não merece meu precioso tempo) demonstra o quão fechado para o que se passa no mundo a sua volta, o diretor parece estar. Em um momento em que as produções televisivas vem se mostrando cada vez mais afiadas técnica e principalmente narrativamente, não me parece uma boa ideia que um sujeito metido no audiovisual diga isso sem um mínimo de vergonha.

E o que isso tem a ver com Elysium? Explico. Ao não perceber e absorver (porque não) aquilo que de melhor vem sendo produzido por aí, faz de seu filme um arremedo de ficção científica, com os mesmíssimos defeitos do superestimado Distrito 9, que conseguiu uma injusta indicação ao Oscar de melhor filme.

Elysium versa sobre um mundo abandonado por guerras e fome em que vivem apenas os mais pobres. Acima de todos numa espécie de satélite que orbita o planeta (o tal Elysium), os ricos e poderosos vivem a boa vida. O protagonismo é de Max (Matt Damon), eu ex-condenado em busca de uma segunda chance. Ao sofrer um acidente na fábrica em que trabalha e ser informado de quem tem poucos dias de vida, decide viajar a qualquer custo ao Elysium, para, uma vez lá, conseguir se curar em uma das máquinas de “cura mágica e instantânea” capazes de salvar qualquer um de qualquer enfermidade, desde que, seja um cidadão do Elysium.

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Assim como em Distrito, Neill prova sua capacidade para conceber – teoricamente – um mundo que ao mesmo tempo em que é critico com a realidade em que vivemos todos os dias, aponta potenciais problemas futuros a partir de nossas ações de hoje. Se em Distrito eram os “camarões” que simbolizavam os negros sul-africanos (país de origem do diretor e roteirista) suprimidos e vitimas de abusos e preconceito, aqui ele expande seu escopo e fala de todos os que são considerados cidadãos de segunda classe, dividindo de forma arbitrária e irreal (típico de alguém que não tem contato com as diferentes visões de mundo que os mais ricos e pobres tem das coisas) o planeta entre pobres miseráveis e ricos super ricos. Ok, relevando a visão estreita sobre as pessoas que Blomkamp demonstra aqui, a trama até se justificaria se não apelasse para clichês na forma de apresentar seus personagens e seu mundo.

Como disse, Max é um ex-condenado e que vive numa imensa favela – que é o se tornou a cidade de Los Angeles – uma imensa massa de pessoas e casas que falam inglês, espanhol, português e todo tipo de dialeto em uma imensa bagunça imunda. Claro, que não basta o sujeito ser o herói, ele precisa ser “o escolhido”, como o filme nos informa assim que os créditos são apresentados. Max foi criado em um orfanato ouvindo de uma freira que ele estava destinado a coisas grandiosas. Ao lado do garoto, a jovem Frea (Alice Braga) vive no mesmo orfanato e se torna o “amor impossível” de nosso protagonista.

Secretary Delacourt (Foster) in CCB HQ Briefing Room is demoted.

Se não bastassem tantos clichês, a representação dos habitantes desse mundo apodrecido é a mais risível possível. A impressão que se tem é a que todos os personagens saíram de um spin off mal sucedido de Mad Max. Todos são “malvados”, “grosseiros”, “mal encarados” e “ruins”. Pessoas boas entre os pobres praticamente não dão as caras. Essa visão simplista acompanha também a visão que Blomkamp tem dos abastados no satélite do Elysium. Todos vestindo branco (e uma população basicamente caucasiana) bebem champanhe, ouvem concertos sinfônicos e se curam do câncer de pele com a facilidade de quem come uma uva. Simplista, apresenta uma população xenofóbica e limitada onde também não existe espaço para aqueles que pensam de forma diferente desse padrão.

Ué, mas isso é uma produção de ação com elementos de ficção científica, porque tanto “mimimi”? Porque Blomkamp enxerga seu filme como uma peça de relevância. Seu filme não é relevante, aliás, ao contrário, é simplista demais e não percebe a ótima ideia que teve em prol de personagens profundamente estereotipados, ações absolutamente injustificadas e desperdício de uma excelente premissa.

Ao ignorar a via do meio, os insurgentes dos dois lados (ou mesmo a classe média, onde será que eles estão escondidos?) Blomkamp limita seu mundo ao velho -e óbvio – clichê do herói versus o vilão sem desenvolver nada além disso, como havia se proposto a fazer nos primeiros minutos. Notem – quando virem o filme – como a primeira meia-hora do filme (mesmo com o discurso “você está destinado a mudar o mundo”) funciona muito bem e nos insere naquela realidade suja e em contraste com o mundo etéreo de Elysium. Uma pena que isso pare ali.

Sharlto Copley plays Kruger in TriStar Pictures' ELYSIUM.

A trama em si é absolutamente derivativa (Blomkamp não deve ter visto muitos filmes também) e no fim se torna um jogo de gato e rato entre a versão “ninja da favela” de Damon contra o brutamontes barbudo e com cara de viking de Sharlto Copley (que nesse mundo simplista é o que melhor se sai e se diverte fazendo de seu vilão assustador). Toda a propaganda sobre o personagem de Jodie Foster é exagerada. Sua personagem, apresentada como uma mulher forte, cruel e decidida, vai se revelando rasa e facilmente substituível e sem nenhuma grande motivação para seus atos. Se o vilão de Copley abraça o “coringismo”, e é daqueles clichês do sujeito que quer ver o circo pegar fogo, a possível percepção de que a personagem de Foster é astuta e inteligente é deixada de lado em detrimento do vilanismo puro e simples.

Os brasileiros (sem nenhum ufanismo) são os que se saem melhor na produção. Alice Braga é a única personagem “real” naquele mundo de excessos. A garotinha amiga de Damon torna-se uma enfermeira que luta contra problemas pessoais e precisa desesperadamente de ajuda. Talvez seja o melhor desempenho da atriz em inglês, que precisa de papéis melhores, porque talento não lhe falta. E Wagner Moura? Seu Spider é um hacker/gangster cheio de cacoetes, problemas de locomoção e com uma atitude enérgica e histérica que confere ao mesmo quase o posto de alívio cômico. Wagner compôs o personagem como um sujeito esguio e ardiloso que trabalha nas sombras para a destruição de um sistema. Sua atitude virulenta diante das ações e sua falta de escrúpulos para conseguir seus objetivos fazem do personagem bastante convincente, embora – como todo o filme – sofra no ato final redentor.

Damon não compromete, mas está longe de seus melhores momentos. A excelente construção técnica do exoesqueleto (presente nos trailers e pôsteres de divulgação) funciona muito bem e agrega um ar cyborg fundamental para que sejamos convencidos de que o personagem está à beira do abismo já que seus implantes são – na melhor das hipóteses – rudimentares. Esse visual, também ajuda a nos convencer de que Max está disposto à atos de extremismo para conseguir seus objetivos.

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Lembrando demais a tecnologia de Distrito 9 – o mesmo vale para o cenário do mundo árido que se tornou a Terra – os efeitos visuais são competentes, mas não saltam aos olhos. A construção dos diversos robôs marcados pelos anos de serviço é uma adição óbvia mas bem vinda que garante mais credibilidade aquele universo, servido por máquinas velhas. A fotografia do filme é a mesma nos dois ambientes em que o filme se passa o que é uma escolha – a meu ver – infeliz. Seja no mundo arenoso da Terra ou no idílico paraíso (com o perdão da piada pronta) de Elysium a fotografia aposta no naturalismo. Nem o uso de algum tipo de filtro para criar alguma espécie de contraste visual, Blomkamp utilizou. Tudo está nas costas do design de produção que acaba dando conta do recado construindo cenários críveis e bastante diversos, mesmo em ambientes iguais.

Elysium se transforma em uma grande decepção. Por algum motivo maluco (ou sádico) mesmo vendo a estética dos pôsteres e trailers, imaginei que Blomkamp não cairia de novo na armadilha que seu Distrito 9 caiu. Desenvolve uma ideia boa, cria-se um mundo que pretende ser crítico, mas prefere-se apostar no lugar comum, no filme de ação clichê e que não tem novidades ao que foi feito até aqui. Mais uma dessa e o diretor sul-africano entra pro hall de Tim Burton: sujeito que tem ótimas ideias e conceitos mas que os desenvolve de forma preguiçosa.

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Dizem que é crítico de cinema, dizem que é um cara legal e dizem também que pode ser bem ranzinza. Outros, no entanto, dizem que "as vezes" ele acerta no que fala, enquanto outros - ele deve pagar essas pessoas - gostam do trabalho dele. Fã de Galactica, Doctor Who, Hayao Miyazaki, David Cronenberg, Dario Argento, Orson Welles, Grant Morrison, Neil Gaiman e comprador compulsivo de filmes.

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