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Mãe! [Crítica com spoilers]

Pedro Mandella 7 anos ago 0 8

 

A trama de Mãe! se desenvolve em torno de um casal que vê seu relacionamento ser testado após a chegada de pessoas não convidadas em sua residência. O fato acaba com a tranquilidade entre eles e perturbadores eventos começam a acontecer.

Ainda estou me sentindo anestesiado com tudo o que assisti. Um filme para ser digerido ao poucos, há muito que pensar antes de formarmos uma opinião absoluta. É um daqueles longas densos, pesados e interpretativos, que nos levam a mudar de opinião constantemente e refletir por dias.

Não é novidade que o diretor Darren Aronofski (Noé) gosta de criar laços conflituosos e intrincados. Em Mãe! não é diferente. As figuras de linguagem, simbologia e interpretação religiosa são a base de um roteiro enigmático e de tirar o fôlego.

Mas, antes de nos dedicarmos à trama, gostaria de ressaltar os pontos técnicos que me chamaram atenção. Em todo o trabalho minucioso de Aronofski no filme, duas coisas são fortemente destacadas e funcionam incrivelmente bem. O enquadramento das câmeras e a ausência da trilha sonora.

O filme é silencioso propositalmente e podemos ouvir absolutamente toda a estrutura da casa, desde o abrir da torneira e o cair da água na pia, aos estalos de madeira que os passos proporcionam. Isso aguça, afia e faz com que o telespectador se envolva, quase pessoalmente, com os cenários.

Quanto aos enquadramentos, são precisos. O quadro é fechado no rosto da personagem de Jennifer Lawrence praticamente durante todo o filme, causando uma espécie de aflição em quem assiste. E, por falar nela, é sem dúvida alguma, na minha opinião, o seu melhor trabalho no cinema. Jennifer está sensacional, vive cada take como uma vivacidade, uma verdade absoluta, uma real entrega à personagem.

O cast também não deixa a desejar, Javier Bardem (Onde os fracos não tem vez), Ed Harris (Apollo 13) e, sobretudo, Michelle Pfeiffer (Batman: O retorno), estão fabulosos.

A fotografia é lindíssima, a iluminação baixa é perfeita para a criação do mistério, da angústia, mais um ponto para o diretor. Os figurinos são simples e recatados, sem muita cor. Os olhares, os gestos, a linguagem corporal são o foco.

Entrando finalmente no plot, temos um filme recheado de informações, tantas que a cabeça chega a dar um nó! Aronofski usa a religiosidade e seus elementos, mais uma vez, como sua principal inspiração.

O filme trata da representação de várias passagens bíblicas, retratando o começo e o fim, o alfa e o ômega. Os personagens da trama não possuem nomes, são desnecessários, uma vez que todos fazem parte de algo maior. Gênesis, por exemplo, é abordado ainda no começo do filme, o poeta (personagem de Bardem) representa a forma divina superior, Deus.

A esposa, interpretada por Lawrence, representa a criação, a mãe natureza, o recomeço e a casa. São vários elementos dentro da personagem, ela recria a casa aos poucos, com devoção, com amor pela obra. As cenas em que dá cor à parede, representam a essência, a vida que ela passa ao lugar.

Temos também a representação de Adão e Eva, o casal que chega à casa e fica deslumbrado com tudo o que vê, com destaque para a curiosidade da mulher, personagem de Pfeiffer, em explorar e desmistificar o ambiente.

A negação à pedra, que caracteriza o fruto proibido, a expulsão do casal após terem-na quebrado, simboliza o primeiro pecado, a desobediência. Tudo orna perfeitamente, com diversas figuras representativas totalmente contextualizadas. Caim e Abel, a Torre de Babel, a transformação e flexibilidade do Deus do velho para o novo Testamento, o nascimento de Jesus, sua morte e o Apocalipse.

A personagem de Jennifer Lawrence representando a vida, a casa, questiona a todo momento sua insuficiência; os fãs do autor que representam fanáticos religiosos, fazem uma crítica pertinente ao fanatismo e à distorção as escrituras, destroem a casa, trazem desordem, anarquia e guerra. Deus não interfere em suas ações, representando o livre-arbítrio, e permite que eles instalem e padeçam de seu próprio caos.

O nascimento representa a vida, o recomeço e a morte, causada pelo próprio desespero e egoísmo dos fanáticos. No final, a entrega do coração, a renúncia, um novo começo, um novo mundo, uma nova casa.

Um filme belíssimo, contudo, sinuoso, carregado e que peca pelos excessos. O telespectador mal tem tempo de registrar todos os acontecimentos. Concordei com amigos, que chega a ser pretensioso.

Aronofski apresenta uma teia de pensamentos que exigem uma compreensão lenta e, simultaneamente, não proporciona o espaço de tempo necessário para absorver todo o conteúdo. Não é um filme para ser entendido, mas para ser interpretado. Todas as visões e analogias feitas aqui, são meus pontos de vista.

Em contextos interpretativos, todas as vertentes de uma mesma cena são aceitáveis e diretores que saem de sua zona de conforto para se arriscar, como Aronofski, merecem, no mínimo, o seu tempo. Recomendadíssimo!

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Written By

Viciado em cinema desde criança, apaixonado por fotografia, café, arte, doces, frio e sextas feiras. Amante da literatura e do cinema francês.

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