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Os Suspeitos [Crítica]

Alexandre Landucci 10 anos ago 0 14

prisoners_ver3_xlgOs Suspeitos

(Prisoners, 2013)

Thriller/Drama – 153 min.

Direção: Denis Villeneuve

Roteiro: Aaron Guzikowski

com: Hugh Jackman, Jake Gylenhaal, Viola Davis, Maria Bello, Terrence Howard, Melissa Leo, Paul Dano

Denis Villeneuve me impressionou positivamente com “Incêndios”, um dos filmes mais intensos que vi em 2012. Antes disso ele também foi muito elogiado por “Politécnica”, produção que vergonhosamente ainda não consegui ver. Portanto, havia uma expectativa para sua estreia no mercado americano e com dois filmes de uma vez: o suspense Enemy e o filme analisado aqui, Os Suspeitos.

Confesso que vendo a divulgação do filme, especialmente o trailer apresentado, e a sinopse da produção me questionei se o canadense não estaria estreando com um projeto “sem assinatura”, onde seria controlado pelo estúdio em busca de um veículo para Hugh Jackman e Jake Gyllenhaal. Porém, além da presença dos dois atores, o elenco ainda apresentava Maria Bello, Terrence Howard, Viola Davis, Paul Dano e Melissa Leo. Todos os atores com indicações ao Oscar e com talento. Passou-se algum tempo e o filme estreou em diversos festivais e foi muito bem recebido. Opa, talvez existisse alguma coisa ali, talvez eu tivesse sido tomado pelo ranço do trailer expositivo e óbvio. Ou, talvez existisse uma predisposição dos colegas em gostar do filme pelo pedigree de seu condutor. Dúvidas que só poderiam ser respondidas quando assistisse a produção.

Durante “Os Suspeitos” fui percebendo que não conseguia piscar. Não era – felizmente – um problema físico, mas a excelência da trama mostrada por Villeneuve. Utilizou-se dos clichês do suspense a seu favor e criou uma trama em formato de quebra-cabeça (ou de labirinto, elemento fundamental na trama) em que cada peça da trama nos é apresentada, mas sem a incomoda sensação de que os realizadores do filme consideram os espectadores incapazes de compreender a trama. Em resumo: Suspeitos é um thriller de trama intrincada com detalhes que precisam ganhar a atenção do espectador, sem, no entanto, apelar para recordatórios, discursos explicativos e outros recursos “for dummies” comuns no cinemão americano.

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A história começa quando a família Dover visita seus vizinhos (os Birch) para celebrar o dia de Ação de Graças. Keller e Grace tem dois filhos, o garoto Ralph e garotinha Anna, assim como seus amigos Franklin e Nancy, que também tem dois filhos, as meninas Eliza e Joy, praticamente da mesma idade dos filhos de seus amigos. Em teoria são famílias espelhadas apenas com a diferença de raça para diferenciá-los. Depois dos comes e bebes, as duas garotinhas decidem irem até a casa dos Dover para encontrar o apito perdido da loirinha Anna. E daí somem. A partir daí a trama se divide na perseguição de Keller ao principal suspeito que a investigação do detetive Loki não consegue manter preso por falta de provas, e o detetive tentando solucionar o caso.

Denis Villeneuve usa uma situação – infelizmente – bastante comum para criar seu quebra-cabeça muito tenso que não busca apenas a solução do thriller, mas também tem a intenção de falar sobre a vingança e os limites de onde o sujeito pode ir para conseguir seu objetivo. Cada peça do quebra-cabeça é importante e merece uma atenção especial do espectador e vai se revelando um novo elemento de uma trama cada vez maior.

A fotografia lúgubre do filme só ajuda a reforçar um ambiente que vai se entristecendo, se corrompendo  e tornando-se claustrofóbico em frente aos nossos olhos. A atmosfera calorosa – apesar do frio – da casa dos Birch no começo do filme é radicalmente diferente do que o filme nos vai mostrando com o decorrer do tempo. As sombras se apossam dos personagens e da vida daquela família. O roteiro da produção é igualmente inteligente nos conduzindo por alguns caminhos que parecem tão precisos e que vão se revelando não tão certeiros assim, ao mesmo tempo em que são corretos dentro da intenção do filme. A religiosidade, tema fundamental na trama, é outro elemento muito bem utilizado e desde – literalmente – o primeiro plano, colocando a fé e a ausência da mesma como mola propulsoras da trama.

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O elenco está todo muito bem. Keller e o detetive Loki são os protagonistas, cada um num espectro da investigação. Hugh Jackman e Jake Gylenhaal que vivem os dois citados respectivamente estão muito bem na produção. Esse talvez seja o personagem mais intenso e assustador do ator em sua carreira (certamente o é dentre seus personagens nos Estados Unidos). Keller é um pai de personalidade forte e que não mede as consequências de seus atos, embora não encontre prazer em momento algum com o que tem de fazer, destituindo-o na alcunha de sádico e afins. Loki beira o comportamento passivo-agressivo, tendo de manter o controle da situação em meio a muita pressão dos pais das garotas sumidas, da própria investigação, os problemas da policia e traumas pessoais. Seu trabalho contido, revela um sujeito metódico, inteligente e que em sua racionalidade consegue resolver as arestas da intrincada produção.

Ao lado dos dois lados dessa moeda, os coadjuvantes também tem seu momento de brilhar, cada um com um “solo”, um momento em que podem demonstrar o talento que tem. Franklin (Terrence Howard) vai se fragilizando a cada nova situação enfrentada e vive em conflito sobre suas ações até desabar em uma cena emocionante. Grace (Maria Bello) entra em estado de negação e se mantém entorpecida diante de suas suspeitas de que o pior acontecera com sua filha e a amiguinha. Nancy (Viola Davis) guarda para si suas impressões e dor, mas as deixa florescer em uma cena maravilhosa e intensa, onde é impossível não se deixar emocionar pela composição da atriz e nos chocar com suas conclusões sobre as ações de seu marido. Paul Dano e Melissa Leo são outros que conseguem entregar interpretações tão intensas quanto à dos dois casais protagonistas. Dano faz de Alex um garoto de fala mansa e fragilidade perturbadora, que nos faz caminhar entre a compaixão e medo. E Melissa parece desde a primeira aparição uma mulher machucada pela vida e a interpretação da atriz nos indica esse caminho.

Os Suspeitos é uma belíssima estreia em território ianque do canadense Villeneuve. Angustiante, tenso, desagradável de ser acompanhado consegue nos inserir naquele ambiente sombrio e cheio de relações com a vida real. Extremamente competente como thriller e intrigante na proposta de não apoiar a posição do “olho por olho, dente por dente” é dos casos raros de entretenimento para adultos. Maduro, inteligente e sem muitas concessões.

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Dizem que é crítico de cinema, dizem que é um cara legal e dizem também que pode ser bem ranzinza. Outros, no entanto, dizem que "as vezes" ele acerta no que fala, enquanto outros - ele deve pagar essas pessoas - gostam do trabalho dele. Fã de Galactica, Doctor Who, Hayao Miyazaki, David Cronenberg, Dario Argento, Orson Welles, Grant Morrison, Neil Gaiman e comprador compulsivo de filmes.

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