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Os Infratores [Crítica]

Alexandre Landucci 11 anos ago 0 61

Conforme prometido pela Patrine durante a Dica do Gyodai do SenpuuCast 89, aí está a crítica do filme Os Infratores!

Para conferir mais críticas dos principais filmes exibidos no cinema, é só acessar o Fotograma Digital.

Infratores (Lawless, 2012)
Drama – 116 min.
Direção: John Hillcoat
Roteiro: Nick Cave
com: Tom Hardy, Shia LaBeouf, Jessica Chastain, Guy Pearce, Mia Wasikowska, Gary Oldman

A lei seca americana talvez tenha sido uma das medidas políticas mais infelizes do mundo ocidental no século XX. Além de não “resolver o problema”, criou uma serie de grupos e grupelhos, mafiosos e “pés-de-chinelo” que criavam, produziam, distribuíam, lucravam e se mantinham apenas da bebida ilegal. Nomes famosos como Al Capone, criaram um império sobre a ilegalidade, que por sua vez só existiu a partir de uma ideia infeliz e conservadora (palavras que quase sempre andam lado a lado).

Infratores, novo filme do diretor John Hillcoat (do estupendo A Estrada) é um retrato pouco visto no cinema americano, que em geral posiciona suas câmeras sobre o tema nas grandes cidades e mafiosos poderosos. A trama acompanha a família Bondurant, formada pelo sombrio e calado Forrest (Tom Hardy), pelo assustado e ainda ingênuo Jack (Shia Labeouf) e pelo vigoroso e colérico Howard (Jason Clarke). Forrest é o mais velho e líder da família que comercializa bebida caseira em sua região.

Seguem sua vida pacata, centrada e bastante cautelosa graças à visão “de negócio” do personagem de Hardy, um sujeito simples e que em suas poucas palavras deixa claro sua visão de mundo. Jack é um garoto intenso e ansioso por se provar tão importante para a família quanto à sapiência de seu irmão mais velho. A vida da família muda quando a procuradoria do estado da Virginia (onde o filme se passa) envia um corruptível e maldoso promotor para conseguir garantir mais algumas notas de suborno, com a ameaça de acabar com a brincadeira familiar caso a mesma não aceite a chantagem oficial.


O filme então acompanha essa disputa politica-social-moral entre os corruptos de gravata e os – no momento em que o filme se passa – bandidos. Ao lado da família de contrabandistas de fundo de quintal, chega à belíssima Maggie (Jessica Chastain), que assim como Bertha (Mia Wasikowska) tornam-se os interesses amorosos dos dois personagens principais da trama.

Hillcoat apesar de tocar em um assunto sério e rechear seu filme de imagens muito violentas, que incluem degolação, castração, tiroteios e muito sangue na cara, consegue – por mais absurdo que pareça – manter o filme com uma levada pop, beirando uma historia em quadrinhos, principalmente pela caracterização dos personagens principais.

Se Tom Hardy emula o vingador solitário, personagem clássico de quadrinhos e dos westerns, Labeouf é quase um sidekick, mas que precisa assumir “o manto do herói” em determinado momento. Já o personagem de Guy Pearce é a mimetização de um vilão de quadrinhos. Seu visual absolutamente excêntrico, com suas luvas, sobrancelhas quase inexistentes e seu cabelo rigidamente repartido ao meio, além da interpretação de Pearce exagerada, remonta aos bons psicopatas dos quadrinhos. Claro, que quando digo quadrinhos, imagino que o leitor tenha compreendido que não estou apontando relação entre o filme de Hillcoat e a Turma da Mônica, por exemplo. A relação é com os chamados quadrinhos adultos, e o clima do filme que é muito menos engajado e politizado do que poderia ser. Lembra o que DePalma fez com Intocáveis (no quesito clima, que fique claro), acrescido de uma boa dose de violência.

O grande destaque é realmente seu elenco estelar. O cada vez melhor Tom Hardy com seus grunhidos, olhar denso e presença cênica intensa, a deslumbrante Jessica Chastain, capaz de criar um magnetismo digno dos mais poderosos imãs, mesmo quando tem em mãos uma personagem que apesar de marcada, não tem um grande arco dramático. Ela funciona como mais uma motivação para a vingança dos irmãos Bondurant e para servir como elo emocional para o travado Forrest. Guy Pearce constrói com desdém seu promotor, uma mistura perversa de afetação e psicopatia. Mesmo o quase sempre limitado Shia Labeouf está bem no papel, conseguindo empregar seriedade e emoção em um personagem com um arco dramático completo, que se transforma durante a projeção, indo do garoto impetuoso e ingênuo a um homem que precisa arcar com as consequências de seus atos impensados.

Completam o elenco, Jason Clarke, como o irmão do meio que funciona como o braço armado da família, o sujeito irritável e que não tem medo de resolver as coisas na base da bala. Mia Wasikowska surge singela e bela como a inocente filha do pastor que se vê seduzida pelo galã malfeitor. E Gary Oldman, cuja participação é bem menor ao que o trailer e a divulgação do filme fazem crer. Quase como uma ponta de luxo, o ator é um mafioso da cidade grande que age como tal, vociferando (sim, Oldman grita, o que sempre é divertido) e ditando regras a todos, mas nada que realmente se destaque.

Hillcoat vai bem na condução da ação e na orientação de seus atores, sendo voyeuristico quando necessário e intrusivo nos momentos mais intensos do filme, como durante um violento atentado. Porém, apesar de não ter receio de mostrar a violência dos atos, é contido e até respeitoso quando seu filme aborda um tema muito mais tenebroso e com consequências psicológicas eternas. Ali, ele é inteligente ao não precisar mostrar nada, apenas sugerir e informar o espectador do que aconteceu.


A montagem do filme é outra qualidade do filme, embora a sequência de ação final do filme, me pareça confusa em excesso. Caracterizados até então como personagens inteligentes e seguros, os irmãos agem como amadores e a montagem só amplifica essa sensação, embora mesmo com esses problemas a mesma ainda mantenha-se vigorosa e tensa. Tanto a trilha sonora quanto o roteiro tem a assinatura de Nick Cave, que já havia composto a trilha atonal e perturbadora de A Estrada. Dessa vez, embebido do folk, Cave consegue realizar um trabalho mais doce e muito mais melancólico do que o desespero auditivo da trilha anterior. Um dos trabalhos mais fortes e bem realizados do ano.

Outro ótimo trabalho é o do time do design de produção e figurinos, que misturam ternos elegantes e carros possantes, com fazendas castanhas e douradas, construções simples de madeira, figurinos humildes (como o chapéu medonho de Forrest e sua predileção por um casaco quase feminino como vestuário) e um clima de desolação típico das cidadezinhas encravadas no interior americano, elemento já usado por Hillcoat (embebido do apocalipse) no citado A Estrada.

Infratores não pretende ser uma historia definitiva sobre a lei seca (embora seja baseada na historia real dos irmãos Bondurant), mas uma interpretação pop e violenta de um fenômeno americano e da vida de gente simples que não se curvava aos desmandos dos corruptos de gravata.

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Dizem que é crítico de cinema, dizem que é um cara legal e dizem também que pode ser bem ranzinza. Outros, no entanto, dizem que "as vezes" ele acerta no que fala, enquanto outros - ele deve pagar essas pessoas - gostam do trabalho dele. Fã de Galactica, Doctor Who, Hayao Miyazaki, David Cronenberg, Dario Argento, Orson Welles, Grant Morrison, Neil Gaiman e comprador compulsivo de filmes.

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